Acordo de vontades nos contratos de adesão

Ígor Araújo de Arruda, Acadêmico de Direito do Centro Universitário de João Pessoa - Unipê.

Fonte: Ígor Araújo de Arruda

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Ígor Araújo de Arruda ( * )

Sumário

1- Introdução. 2-Considerações iniciais. 3- Formação contratual. 4- Contrato de Adesão. 5- Liberdade contratual. 6- Classificação das cláusulas. 7- Psicologia da aderência e seus consectários. 8- Conclusão.

Resumo

Versa cá acerca dos contratos de adesão e seus consectários, e eventuais percalços que possam vir a surgir. O contrato de adesão com o acordo de vontades, se possível na fase inicial da formação contratual (puntuação); a presença de cláusulas abusivas, vexatórias, como conseqüência à liberdade contratual mitigada e à falta do acordo intimamente querido e flagrado; classificação às cláusulas desse tipo contratual; por final, versando um aspecto à solução de cláusulas abusivas insertas no contrato de adesão, assim como cláusulas que estipulam uma presunção de conhecimento de todas as outras e seu efetivo cumprimento incondicionado.

PALAVRAS-CHAVE: Acordo de vontades; Liberdade Contratual; Cláusulas Abusivas; Presunção de Conhecimento.

Introdução

O Direito tem por característica maior a sua versatilidade, modificando o seu conteúdo celeremente, acarretando em um desacompanhamento estatal, pois impossível o fazer de fato. Acontece, igualmente, essa mudança nos contratos - como em todo o ordenamento jurídico - como se dá nos Contratos de Adesão, em que a demanda por uma aceleração contratual é uma realidade. Malgrado haja esse aspecto positivo contratual, suscitarão conseqüentemente alguns eventuais problemas entre as partes acordantes. Exposição a seguir.

Desenvolvimento

1. Considerações iniciais

Para início desse ligeiro estudo, comecemos por definir o que vem a ser contrato. Consoante a lição de Beviláqua contrato é o "acordo de vontades para o fim de adquirir, resguardar, modificar ou extinguir direitos". Portanto, esse acordo de vontades seria a manifestação de contratar dos futuros denominados contraentes, seja expressa, tácita ou presumivelmente, mas de uma maneira que possa flagrar a sua real intenção de formar a relação contratual. O acordo mais especificamente se dá quando os contratantes, ab initio, acordam as cláusulas, condições contratuais, prazos, local de solução litigiosa, inobservância e cláusula penal - multa - etc.

Em regra, nos contratos lato sensu existe esse supracitado acordo, que tenta se passar da melhor maneira, de beneficiar os acordantes e fazer uma relação contratual equânime. Para que haja uma relação igualitária entre estes, tem de haver uma estipulação prévia das condições contratuais e que tragam, da melhor maneira, as peculiaridades de cada contratante, não apenas impondo um contrato a que outro(s) venha(m) a se submeter, como acontece no contrato do presente estudo - contratos de adesão. Entramos, pois, no campo da formação contratual.

2. Formação contratual

A formação do contrato é uma divisão que se faz doutrinariamente para facilitar não só o estudo dos aplicadores jurídicos, mas também serve no âmbito pragmático do direito. Subdivide-se em três etapas:

a) Negociações preliminares/Puntuazione: vem a ser uma fase prescindível, precária, discricionária. Ou seja, é uma fase contratual, não-obrigatória, em que as partes estipulam as cláusulas contratuais e algumas condições supramencionadas no ponto 1. Essa fase, a despeito de prescindível ser, tem em muito facilitado o acordo contratual e rechaçado de toda forma os dissídios que do contrato possam sobrevir. No entanto, é uma fase discricionária, não-vinculante, ou melhor, o contratante que faz determinada oferta/proposta nessa fase não se vincula ao outro, não se obriga às regras contratuais inicialmente, dando margem a uma gama de ofertas indiscriminadas a consumidores e destinatários de tal oferta.

b) Fase da Policitação: é uma fase que, diferente da anterior, dá maior segurança jurídica aos contraentes, por possuir força vinculante. É um negócio jurídico unilateral receptício, em que apenas uma das partes lança uma proposta, com prazo ou não, sejam juridicamente presentes ou ausentes, a outra e dela espera uma resposta ou silêncio (inércia, em regra, o não aceite, ou quando qualificado implicando numa aquiescência presumida). Consectariamente à essa força vinculante, há exceções, tipificadas no artigo 428, do Código Civil.

c) Aceitação: como sobredito, seja de quaisquer formas que possam exteriorizar tal vontade positiva do oblato ao proponente, só que tempestivamente (no tempo consentâneo: dentro do prazo dado, ou quando não, suficiente para uma resposta) e a toda a proposta, na sua íntegra.

3. Contrato de adesão

Como preleciona Messineo, "contrato de adesão é aquele em que as cláusulas são previamente estipuladas por um dos contraentes, de modo que o outro não tem o poder de debater as condições, nem introduzir modificações no esquema proposto; ou aceita tudo em bloco ou recusa tudo por inteiro ('é pegar ou largar')". Diferentemente acontece nos contratos paritários e de massa (em série ou por formulários). Aquele os contratantes estipulam previamente as condições contratuais da melhor forma, seja na fase da puntuação, seja na policitação, havendo igualdade formal e material entre as partes estipulantes. Nos contratos de massa, em muito assemelhados aos de adesão, são aqueles em que há as cláusulas previamente elaboradas e redigidas por uma das partes, no entanto elas são colocadas ao oblato para modificá-las, se entender necessário, havendo deveras igualdade na relação. Nos contratos de adesão, em parte assemelhados aos contratos de massa, cláusulas contratuais previamente elaboradas, não há possibilidade de o oblato modificar, em parte ou no todo, o contrato estipulado pelo ofertante. É aceitar tudo aquilo que ele estipula, ou ficar de fora nessa relação contratual, querida ou não. Surge o problema de o policitante exceder no seu poder de criar as cláusulas e colocá-las abusivamente à outra parte, ou pior acontece quando essa abusividade não é percebida pelo aceitante, ou é exígua (apenas uma cláusula, verbi gratia), mas que traz conseqüências nefastas ao oblato. Quando o ofertante estipula cláusula em que inverte o ônus da prova, p.ex., quando um indivíduo não teve condição de ler o contrato e de saber as suas condições de cumprimento, e que no contrato foi colocado que ele está ciente de todas as cláusulas e obriga-se a cumpri-las incondicionalmente. Como proceder nesse caso?

4. Liberdade contratual

Entre os de maior relevância está o Princípio da Autonomia da vontade, aquele em que dá o direito das partes contratarem, de versarem sobre o contrato (vedações de conteúdo ilícito), de quando contratar, com quem contratar, não sofrendo ingerência estatal (em regra), como o era outrora, e formar contratos não só os tipificados em lei, como também de criarem novos contratos (atípicos: não estipulados pormenorizadamente em lei), na medida em que impossível o acompanhamento estatal nas diversas modalidades culturais nacionais e regionais (CC, art. 425). Subdivido, doutrinariamente, está essa liberdade contratual:

a) Liberdade de celebrar contratos: liberdade de contratar ou não, impossibilitando o Estado vedar a prática de formação contratual, salvante os casos de ilicitude.

b) Liberdade subjetiva: a de escolher com quem contratar. Escolha das partes que estarão no contrato.

c) Liberdade de conteúdo: sobre o que contratar; o objeto de contrato; o que versará o contrato.

Acontece que, nos contratos de adesão, essa liberdade contratual em muito vem sendo mitigada. Doutrinadores dissertam o tema retratando o aspecto positivo desse tipo contratual (necessidade do Século XX em dinamizar os contratos, à medida que aumenta o grande número de contraentes), trazendo deveras celeridade contratual, acelerando os negócios jurídicos e dando acesso a um maior número de contratantes aos bens fornecidos nos contratos, ou seja, facilitando a prática contratual, em que uma das partes estipula as regras contratuais e a outra, que não é pessoal, mas um número indeterminado de pessoas, aceita integralmente ou as rechaça, havendo um maior aspecto positivo em primazia do aspecto negativo. Continuando os renomados, suscitam haver uma proteção civilista acerca do tema, nos artigos 423 e 424 do Código Civil:

Artigo 423: "Quando houver nos contratos de adesão cláusulas ambíguas ou contraditórias, dever-se-á adotar a interpretação mais favorável ao aderente".

Artigo 424: "Nos contatos de adesão, são nulas as cláusulas que estipulem a renúncia antecipada do aderente a direito resultante da natureza do negócio".

Essa proteção, no entanto, é assaz escassa. Dá tutela apenas ao Princípio da Interpretação mais favorável à parte mais suscetível da relação, distintamente do que acontece com o Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/90), protegendo não só a de praxe desigualdade formal, mas também a desigualdade material latente entre consumidores e fornecedores. Outrossim, os próprios princípios gerais do Código Civil vêm sendo preteridos, a saber: Boa-fé Objetiva, Probidade, Função Social do Contrato, alguns em parte, outros flagrantemente postergados.

Com a devida vênia aos autores que pensam que os contratos de adesão são em parte maior, benéficos à sociedade, ousamos divergir desse pensamento. A despeito dessa pequena proteção legal que o Código Civil deu a esses contratos, não podemos achá-lo de todo benéfico. O que vemos no concernente à liberdade, das três supracitadas, existência de apenas uma delas, qual seja: liberdade de contratar. Liberdade essa óbvia contemporânea e modernamente. As liberdades mencionadas nas alíneas a e b, ou não são encontradas, ou quando as são, dificilmente percebíveis. A liberdade de contratar pode existir quando alguém procura um serviço secundário, prescindível na praxe, exempli gratia, contratar com operadoras de internet. Distintamente acontece quando celebramos contrato com as concessionárias ou permissionárias de serviço público que detêm um monopólio ou oligopólio no mercado de fornecimento, estando quase que obrigados a contratá-las, v.g., contrato de fornecimento de água, energia elétrica, gás etc. No atinente à liberdade de conteúdo torna-se mais fácil a percepção da desigualdade material existente entre ambos os contratantes, no qual o contratante-oblato, de fato, só adere ao conteúdo estipulado (abusivamente, às vezes), ficando à mercê do que o ofertante vai estipular.

Os contratos de adesão são, em sua maioria, abusivos, devendo, portanto, ter uma maior fiscalização preventiva das autoridades competentes, na medida em que se desse uma maior participação do aderente, esse tipo de contrato tornar-se-ia o retrotranscrito contrato de massa. Deve-se, outrossim, evitar a todo momento a formação de monopólio dessas concessionárias/permissionárias, a concentração de capitais, privados ou estatais, nas grandes empresas; deve-se instigar uma maior competição no mercado, fazendo com que os ofertantes dêem melhores condições contratuais, preço, prazo de débito etc. , que atraiam os destinatários para tanto.

Portanto, trazendo uma política pública beneficiária à população, podem-se melhorar as condições desses contratos que para muito são desconhecidos (não só esse tipo contratual como também suas regras), facilitando os acordos e gerando maior fluxo comercial.

5. Classificação das cláusulas

Como todo tipo contratual, classificados são eles para fins didáticos e pragmáticos. Suas cláusulas, âmago do contrato, são postas em classe: impessoais e gerais - dispostas aos futuros aderentes, só que não pessoalmente, mas dirigidas indeterminadamente, a grandes números de pessoas que possam a vir contratar; uniformes e rígidas - invariabilidade contratual, não-flexibilização, nos quais esses contratos impedem alterações sem acordo prévio, como arrependimento unilateral, modificações unilaterais - sobretudo aquelas em que o proponente modifica e trazem prejuízos às partes aderentes, pois as que benefício trouxer, permitidas estarão; também as que excluem a teoria da imprevisão, ou seja, mesmo havendo força maior, caso fortuito ou onerosidade excessiva a uma das partes, obrigada ainda estará esta a cumprir o prometido inicialmente; predeterminadas - em que o policitante pensa, redige e estipula todas as cláusulas previamente, não dando margem à participação do oblato, havendo, pois, desigualdade material latente; por final, abstratas.

6. Psicologia da aderência e seus consectários

Imaginemos um caso, por conjectura, de um administrador de um condomínio que contrata com uma empresa concessionária de serviço público para fornecimento de água e energia elétrica. Como é de praxe nesses contratos de adesão, as pessoas não os lêem cabalmente, quando o fazem desconhecem alguns conteúdos neles previstos. Prosseguindo, o administrador do supracitado condomínio firma tal contrato com tal empresa. Nesse contrato vinha uma cláusula mencionando estar ele ciente de todas as outras e que se obrigava, solidariamente aos outros condôminos, de observá-las a qualquer custo e de qualquer forma, ou seja, o policitante previa que o oblato cumprisse rigorosamente o que estava predito no contrato, seja da forma que fosse. Como proceder no concernente ao descumprimento de uma cláusula contratual, em que o oblato tinha razão, no entanto ia de encontro a essa cláusula de obrigação incondicional de cumprimento. Será ela, pois, abusiva?

Conforme preconiza Francesco Messineo, os requisitos dos contratos são: o consentimento, a causa lícita, a prestação (possível, lícita e determinável), a forma (quando requerida ad substantiam) e o motivo lícito (excepcionalmente). Continua ainda o insigne autor a falar em Reserva Mental, que, em suma, seria declarar querer aquilo que na realidade não queria. Ou seja, o indivíduo assina um contrato, em que neste está predito que ele cumprirá todas as regras que forem previstas e que futuramente possam vir a aparecer. Ele firma esse contrato, mas na realidade (intrinsecamente), não era aquilo que, de fato, ele queria. Tendo, em tese, um consenso burlado. Terá ele, portanto, de cumprir essa norma maior que o obriga a cumprir todas as outras pré-estabelecidas, mesmo sendo outras, outrossim, abusivas? Não, na nossa acepção, com fulcro na doutrina majoritária, por ser ela abusiva, vexatória (cláusulas que atuam em benefício dos que as têm preestabelecido, mantendo a outra em condições de inferioridade jurídica, p.ex. mudança do ônus da prova, no CDC) e, por isso, passível de ser invalidada, nula de pleno direito. Essa cláusula estipula uma presunção de conhecimento, mesmo que exteriorizada uma vontade não querida (falta de vontade de conteúdo), exige ela o seu cumprimento efetivo. A anulabilidade deve alcançar todo o contrato, não apenas a vexatória.

Conclusão

Tentamos de forma perfunctória tratar do tema dos atos volitivos nos contratos, na medida em que vêm sendo mitigados em detrimento da vontade do policitante, causando sobremaneira inferioridade jurídica ao oblato. Quais seriam as formas de conseguir, não fazer um maior acordo entre as partes, mas de instigar o comércio acirrado, fazendo com que os ofertantes dêem melhores condições contratuais, trazendo maiores benefícios aos aceitantes, descartando, anulando e invalidando as cláusulas abusivas que, por ventura, possam sobrevir.

Referências Bibliográficas

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. 3.ª ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2007.

TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional. 2.ª Ed. rev. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2003.

IHERING, R. V. A luta pelo direito. São Paulo: Martin Claret, 2005.


Notas:

* Ígor Araújo de Arruda, Acadêmico de Direito do Centro Universitário de João Pessoa - Unipê. [ Voltar ]

Palavras-chave: contratos de adesão

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