A tripartição do poder

Marcella Cardoso de Oliveira e Suzane Ramos Rosa, alunas da Faculdade de Direito - Universidade do Vale do Paraíba - SP.

Fonte: Marcella Cardoso de Oliveira e Suzane Ramos Rosa

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Marcella Cardoso de Oliveira e Suzane Ramos Rosa ( * )

O artigo segundo da nossa Constituição Federal reza que "são poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário". O que se caracteriza aqui são três características fundamentais do poder político: a indivisibilidade, a indelegabilidade e a unidade.(1)

Entretanto, não é o bastante nos referirmos somente ao poder político. O governo é o conjunto de órgão mediante os quais a vontade do Estado é formulada, expressada e realizada, constituindo o poder político. A formulação, a expressão e a realização são funções do poder político, exercidas e cumpridas pelos órgãos do governo, legislativo, executivo e judiciário.(2) Assim, temos que a tripartição do poder decorre da necessidade de especialização funcional, o que, historicamente demonstra-se como método essencial para a garantia dos direitos do homem.

Há quem entenda que tal tripartição é dos poderes; contudo, é essencial que grifemos a nossa adoção da expressão tripartição do poder (e não dos poderes), do qual surgem três especializações de funções desse mesmo unívoco poder.

A ciência política e a teoria geral do Estado atribuem os estudos da tripartição do poder à filosofia grega, no que é pertinente à concepção da polis. O antecedente mais remoto da separação de poderes encontra-se em Aristóteles, que considera injusto e perigoso atribuir-se a um só indivíduo o exercício do poder, havendo também em sua obra uma ligeira referência ao problema da eficiência, quando menciona a impossibilidade prática de que um só homem previsse tudo o que nem a lei pode especificar.(3)

Na Idade Média, John Locke, no Segundo tratado do governo civil, que também reconheceu três funções distintas, entre elas a executiva, consistente em aplicar a força pública no interno, para assegurar a ordem e o direito, e a federativa, consistente em manter relações com outros Estados, especialmente por meio de alianças.(4)

Entretanto, quem de maior expressão analisou a tripartição do poder, e contribuiu para que se erigisse a noção ocidental e moderna de Estado, foi o Barão de Montesquieu, em o Espírito das Leis, em cuja obra, como bem comenta o desembargador Pedro Vieira Mota, Montesquieu ensina "como evitar a concentração do poder, como dividi-lo, para que haja lei, lei de verdade, lei ajustada ao espírito das leis, o espírito nacional". Dentre seus trabalhos há que se destacar o "sistema de freios e contrapesos" (checks and balances), segundo o qual é fundamental à divisão do poder a busca do equilíbrio do poder, para que se realize o bem da coletividade, as interferências entre as funções do poder, pois é dessa maneira que eles serão harmônicos.

Dessa forma, a tripartição do poder prevista por Montesquieu, visa, basicamente, dar ao cidadão a garantia de ter seus direitos respeitados. O poder é uno, mas para facilitar a administração, faz-se necessário dividir as funções em Executiva, Legislativa e Judiciária. Afinal, dentro de um Estado Democrático de Direito, esta tripartição dos poderes é relevante para um desenvolvimento social e justo. Assim, os poderes convivem de maneira harmônica e independente, objetivando alcançar o bem de todos.

Destaque-se que a harmonia do poder ocorre na medida em que o legislativo, o executivo e o judiciário possuam esferas de atuação fortemente delineadas e independência orgânica, de forma que não ocorra subordinação entre os mesmos, mas que sem prejuízo um possa fiscalizar o outro, sem que isso fira o espaço de cada um deles.

O objetivo central da tripartição do poder, segundo o Montesquieu assinalou, é a realização do bem da coletividade, pois "quando uma pessoa ou o mesmo corpo de magistratura o poder legislativo está reunido ao poder executivo, não há liberdade, pois que se pode esperar que esse monarca ou esse senado faça leis tirânicas para executá-las tiranicamente" (Apud Alexandre de Moraes).(5)

Não obstante o que já mencionado, devemos explanar brevemente sobre cada uma dessas funções do poder. A função legislativa é exercida pelo Congresso Nacional, que é composto pela Câmara Federal, representante do povo, e o Senado Federal, representante dos Estados. Sua função, em última análise, consiste em elaborar leis.

À função executiva cabe a administração do Estado, sempre de acordo com as leis elaboradas pelo Legislativo. No Brasil tal função é caracterizada pelo Presidencialismo, ou seja, o representante da função executiva é o Presidente da República. Cita-se, para tanto, o artigo 76 da Constituição Federal: "O Poder Executivo é exercido pelo Presidente da república, auxiliado pelos Ministros de Estado".

O Judiciário presta a atividade jurisdicional do Estado - a aplicação da lei ao caso concreto. É composto por técnicos da área jurídica, diferente dos outros poderes onde os leigos podem atuar uma vez que eleitos. Uma especial competência lhe é conferida - ao Supremo Tribunal Federal, órgão dessa função, cumpre processar e julgar a constitucionalidade ou inconstitucionalidade de uma lei - tema esse que é muito importante para o desenvolver de nossa pesquisa.

Não podemos nos esquecer, dentro desse contexto, do papel do Ministério Público, em nossa atual ordem constitucional, que lhe confere atuação essencial à função jurisdicional. "Essa opção do legislador constituinte de elevar o Ministério Público o defensor dos direitos fundamentais e fiscal dos Poderes Públicos, alterando substancialmente a estrutura da própria Instituição e da clássica teoria tripartição dos Poderes, não podendo ser ignorada pelo intérprete, pois se trata de um dos princípios sustentadores da teoria dos freios e contrapesos de nossa atual Constituição Federal".(6)

Dessa maneira, "a teoria tripartição do poder" visa a proteção de direitos e deveres dos cidadãos frente a um possível Estado onipotente ou um governante tirano, e dela nos ficou isso que é o essencial, independe ser esse poder, de fato, tripartido ou repartido entre quatro, ou mais funções. Fundamental é que o poder não seja concentrado de tal maneira a impedir que o Estado cumpra o seu papel. Importa mencionar que o Estado não pode ser meio de poder para satisfazer ou beneficiar alguns grupos - o Estado existe para a conservação do bem comum.

BIBLIOGRAFIA

ARISTÓTELES. A Política. São Paulo: Editora Hemus, 2005.

DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos da Teoria Geral do Direito. São Paulo: Editora Saraiva, 2003.

FIGUEIREDO, Marcelo. Teoria Geral do Estado. São Paulo: Editora Atlas, 2001.

MORAES. Alexandre de. Direito Constitucional. São Paulo: Editora Jurídico Atlas, 2005.

SILVA, José Afonso. Aplicabilidade das Normas Constitucionais. Curso de Direito Constitucional Positivo. 24ª edição. São Paulo: Editora Malheiros, 2004.


Notas:

* Marcella Cardoso de Oliveira e Suzane Ramos Rosa, alunas da Faculdade de Direito - Universidade do Vale do Paraíba - SP. [ Voltar ]

1 - SILVA, José Afonso. Curso de Direito Constitucional Positivo. 24ª edição. São Paulo: Editora Malheiros, 2004. p. 107. [Voltar]

2 - Idem. Op. cit. p. 108. [Voltar]

3 - DALLARI, Dalmo de Abreu Elementos da Teoria Geral do Direito. São Paulo: Editora Saraiva, 2003. p. 217. [Voltar]

4 - MORAES. Alexandre de. Direito Constitucional. São Paulo: Editora Jurídico Atlas, 2005. p. 366. [Voltar]

5 - MORAES. Alexandre de. Direito Constitucional. São Paulo: Editora Jurídico Atlas, 2005. p. 367. [Voltar]

6 - MORAES. Alexandre de. Direito Constitucional. São Paulo: Editora Jurídico Atlas, 2005. p. 370. [Voltar]

Palavras-chave: poder

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