A psicografia no Direito

Débora Fantini Rodrigues Oliveira, estudante do 5º ano da Faculdade de Direito Mackenzie.

Fonte: Débora Fantini Rodrigues Oliveira

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Débora Fantini Rodrigues Oliveira ( * )

A psicografia é uma comunicação direta do espírito com uma pessoa dotada de mediunidade, sendo esta comunicação de três formas.

A primeira forma de comunicação é a consciente, em que o médium, apesar de reconhecer que as palavras por ele escritas não são de sua autoria, ele permanece consciente em todo o processo e dessa forma, acaba influenciando o conteúdo do texto.

A segunda forma é a semi-mecânica, em que o médium apesar de consciente não influência o conteúdo da transcrição com seus pensamentos.

E por fim a forma, tecnicamente mais apropriada, é a mecânica, na qual o médium escreve sem sequer ter noção do que está fazendo, pois o espírito age diretamente utilizando-se apenas das mãos e dos braços do intermediário.

A partir dessa definição percebemos que um médium que psicografa mecanicamente tem total possibilidade de transcrever exatamente o que determinado espírito pretendia dizer.

De acordo com Carlos Augusto Perandrea, cabe perícia na assinatura psicografada, o que comprova a autoria designada ao espírito, e enseja maior confiança nesse novo instituto.

O direito Penal admite vários meios de prova, desde que sejam lícitas e válidas, e portanto, a psicografia deve ser encarada como uma ciência, como uma verdade.

A prova no direito penal é buscar a verdade dos fatos, é a verdade dentro do contexto, já o meio de prova é o meio para possibilitar essa verificação dos fatos.

Os meios de provas estão dispostos no artigo 332 ao 443 do CPC, entretanto em alguns casos até a prova ilícita é aceita de acordo com o seu peso, dessa forma por que a psicografia não pode ser encarada como meio de prova?

A ciência atualmente garante uma prova concreta, como é o caso do DNA, dito como uma prova segura, portanto, a psicografia encarada como ciência, deve ser aceita pelo Direito.

De qualquer forma, nenhuma prova sozinha faz certa a coisa provada, por isso mais uma vez, se juntarmos os fatos, com a carta psicográfica, com a perícia grafotécnica comprovada dessa carta, está mais do que certo que essa prova é lícita. Ademais, nenhuma prova tem o valor absoluto, sendo que há possibilidade de ocorrência de falsidade em qualquer tipo de prova.

De acordo com o artigo 332 do Código de Processo Civil, as provas devem ser legais, moralmente legítimas e hábeis. A psicografia é lícita, não vai contra a moral e comprova os fatos mesmo que utilize outro meio de prova para enriquecê-la, como é o caso da perícia grafotécnica. Dessa forma, a prova será válida desde que esteja em harmonia com outras provas não proibidas pelo Direito Positivo Brasileiro.

Já há jurisprudência relativa ao assunto em comento. Em maio de 2006, no Rio Grande do Sul, Iara Marques Barcelos foi inocentada pela própria vítima Ercy da Silva Cardoso, que é o falecido amante da acusada, que afirmou por meio de psicografia que Iara não foi responsável por sua morte.

Em 17 de maio de 2007, Minton dos Santos, acusado de matar Paulo Roberto Pires, chamado de Paulinho do estacionamento, foi inocentado devido a uma carta do próprio Paulinho, negando a autoria de Milton.

Em 1979 houve um caso em Goiás, na qual como havia dúvida devido a carta psicografada, decidiu-se que o réu seria inocentado, de acordo com o princípio "in dubio pro reu"

Abaixo, segue uma ementa em que foi comprovada a falsidade da carta psicografada, o que abre precedente para que alguma outra carta seja comprovada a sua autenticidade:

"EMENTA: APELAÇÃO CRIME. JÚRI. NULIDADE. JURADO QUE FOI CLIENTE DO ADVOGADO DE DEFESA. FATO QUE NÃO ERA DE CONHECIMENTO DA ACUSAÇÃO POR OCASIÃO DO JULGAMENTO. OCORRÊNCIA DE NULIDADE, ART. 564, II, DO CPP. OS IMPEDIMENTOS E SUSPEIÇÕES DOS JURADOS SÃO OS MESMOS DOS JUÍZES TOGADOS POIS EXERCEM FUNÇÃO JURISDICIONAL. A NULIDADE ATINGE A FORMAÇÃO DO CONSELHO DE SENTENÇA E VICIA O JULGAMENTO 'AB INITIO'. POR MAIORIA, DERAM PROVIMENTO AO APELO DO MINISTÉRIO PÚBLICO PARA DECLARAR A NULIDADE DO JULGAMENTO. VOTO VENCIDO. (Apelação Crime Nº 70016184012, Primeira Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator Vencido: Manuel José Martinez Lucas, Redator para Acordão: Marcel Esquivel Hoppe, Julgado em 27/06/2007).

ASSUNTO:

1. Júri. Nulidade. Caracterização. 2. Júri. Nulidade. Conselho de Sentença. Irregularidades. Disposições doutrinárias e jurisprudenciais. 3. Júri. Nulidade. Conselho de Sentença. Irregularidades. Jurado que foi cliente do advogado do réu. 4. Júri. Nulidade. Disposições doutrinárias e jurisprudenciais. 5. Jurados. Suspeição ou impedimento. Caracterização. Jurado que foi cliente do advogado de defesa. 6. Jurados. Suspeição ou impedimento. Advertência. Necessidade. 7. Falsidade da carta psicografada. Alegação não discutida no acórdão. 8. Júlio Fabbrini Mirabete. Código de Processo Penal Interpretado. 5ª edição. 9. Guilherme Souza Nucci. Código de Processo Penal Comentado. 5ª edição, p. 254. (1)

Concluindo, o que a sociedade precisa é desvincular a idéia de religião que se tem da psicografia, para poder encará-la como ciência, e aceitá-la como meio de prova subsidiário e não autônomo, ademais, qualquer prova não pode ser de toda confiada ou desconfiada. O grande problema que impacta a aceitação da psicografia como prova, é o positivismo puro que ainda impera em nossa sociedade e na doutrina mais tradicional.


Notas:

* Débora Fantini Rodrigues Oliveira, estudante do 5º ano da Faculdade de Direito Mackenzie. [ Voltar ]

1 - Apelação Crime nº 70016184012 , 1ª Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, relator: Manuel José Martinez Lucas, julgado em 27/06/2007. [Voltar]

Palavras-chave: psicografia

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3 Comentários

Renata Cerci Pompermayer Ruschel advogada15/10/2007 17:45 Responder

O entendimento da autora não coaduna com a Constituição Federal, por uma série de fatores. Em primeiro lugar é totalmente vedada a utilização de meios ilícitos como meio de prova, ao contrário do que a autora afirma. De outra banda a Constituição veda qualquer interpretação fora do texto legal , sendo em verdade, este o seu limite, conforme ensina Konrad Hesse. Com a devida vênia, os meios balisados pela Carta Magna são suficientes para a análise do caso in concreto. E mais, os meios de interpretação para a solução de um hard case tem fundamento no princípio da ponderação (Dworkin) o que foge a aplicação da psicografia. Sem ferir qualquer motivação religiosa, o aplicador e intérprete do direito deve ter como método de interpretação o estudo e a sabedoria, esta sim como meio supremo de dirimir os conflitos existentes.

José Vicente Advogado16/10/2007 0:19 Responder

O problema da prova psicografada é que ela sempre vai ser encarada como atividade de uma religião. Embora "Deus" esteja no preâmbulo da constituição, nos orgulhamos de ter uma constituição laica. A aceitação de peças psicografadas afastaria a racionalidade da justiça e abriria margem para todo tipo de exploração religiosa, de vários "representantes diretos de Deus". Partindo do pressuposto da possibiilidade da comunicação, algumas incertezas se apresentam. Como saber se o espirito comunicante é realmente quem ele diz ser? Como saber se o espírito comunicante, sendo quem deve ser, está dizendo a verdade? Não podemos esquecer que ninguém melhora ou piora depois de desencarnado.

Dixon Tôrres Professor de Direito do Trabalho17/10/2007 20:20 Responder

Prezada Débora. Gostei muito de seu artigo, muito bem fundamentado, concordo com vocês neste aspecto. Meus parabéns. Professor. Dixon Tôrres

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