A inconstitucionalidade do afastamento do Juizado Especial Criminal nas infrações de menor potencial ofensivo nos crimes de Violência Doméstica

Flávio Ribeiro da Costa, Advogado Publicísta Especialista em Direito Penal e Processual pela UNIRP, Pós-graduado em Direito Público Universidade Federal de Uberlândia 2007.

Fonte: Flávio Ribeiro da Costa

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Flávio Ribeiro da Costa ( * )

A Lei 11340/06, conhecida como Maria da Penha, excluiu qualquer chance de aplicabilidade da Lei 9099/95 aos crimes praticados com violência domestica e familiar contra a mulher, independentemente de qualquer pena, conforme se verifica do art. 41 deste diploma.

Assim, visando agravar o rigor dos crimes praticados violentamente contra a mulher, seja a violência física, psicológica, sexual ou moral e matrimonial (art. 7º, I a V da Lei 11340/06), a mens legis foi a de proibir toda e qualquer aplicação da Lei 9099/95 para os crimes praticados contra a mulher, desde que possuam como âmbito normativo e de espaço físico a unidade domestica, o âmbito da família, incluindo aquela decorrente de laços de afinidade e as relações intimas, acentuado a aplicação teoria do Direito Penal Simbólico, sustentada por Günther Jakobs.

Ocorre que, o dispositivo legal em comento com a redação clara do art. 98, I. da CRF/88, vê-se que o legislador constitucional outorgou á lei ordinária o dever de regulamentar o conceito daquilo que resolveu chamar de infração de menor potencial ofensivo, assim dispondo: "[...]Art. 98. A União, no Distrito Federal e nos Territórios, e os Estados criarão: 1- juizados especiais, providos por juizes togados, ou togados e leigos, competentes para a conciliação, o julgamento e a execução de causas cíveis de menor complexidades infrações penais de menor potencial ofensivos, mediante os procedimentos oral e sumaríssimo, permitidos, nas hipóteses previstas em lei, a transação e o julgamento de recursos por turmas de juizes de primeiro grau [...]"

Sendo assim, diante da necessidade de concretização do texto constitucional, o legislador ordinário, quando da promulgação da Lei 9099/95, definiu aquilo que poderia adequar-se ao conceito de menor potencial ofensivo, prevendo no seu art. 61 todas as contravenções penais e os crimes cuja pena máxima não fosse superior a um ano, executados os casos legais de previsão para adoção do procedimento especial, sem embargo da modificação posterior do conceito trazida pela redação original art. 2º Parágrafo único da Lei 10259/01, posteriormente alterado pela Lei 11313/01.

Portanto, a infração de menor potencial ofensivo foi e é uma determinação constitucional, além de constituir-se também como um direito e garantia constitucional, do cidadão em face do Estado, razão pela qual não é licito ao legislador infraconstitucional violar a norma constitucional, a qual ocupa o status superior, abolindo-se o conceito de infração de menor potencial ofensivo,quando esse vier a ocorrer nas hipóteses do art. 5º da Lei 11340/06.

Pela interpretação trazida pelo art. 41 da Lei 9099/95, a implementação do Juizado de Violência Domestica ab-rogou o tradicional conceito de infração de menor potencial. Na verdade ele apenas deveria vedar a aplicabilidade dos institutos despenalizadores trazidos pela lei dos Juizados Especiais, tais como a composição dos danos civis, transação, a suspensão, condicional do processo, o que em nada infringiria a Constituição, já que o próprio constituinte originário delegou ao legislador ordinário a prerrogativa de estabelecer quais as hipóteses de incidência ou não dos citados institutos. Vale a pena lembrar da parte final do art. 98, I, Constituição Republicana de 1988: [...] infrações penais de menor potencial ofensivo, mediante os procedimentos oral e sumaríssimo, permitidos, nas hipóteses previstas em lei, a transação e o julgamento de recursos por turmas de juizes de primeiro grau [...].

De fato, não sendo essa a redação da norma em comento, não há óbice á aplicação do Principio da Interpretação Conforme a Constituição,a qual visa buscar a interpretação que não contra-venha o texto constitucional.

Dissertando sobre o Principio, entendemos que o conceito dado pela lei em comento sugere a necessidade de buscar uma interpretação que não seja a que decorre da leitura mais obvia do dispositivo, mas a que tenha por finalidade excluir a interpretação ou as interpretações que contravenham a Constituição.

Em linhas gerais, é possível decompor didaticamente o processo de interpretação da norma legal que a mantenha em harmonia com a Constituição, em meio a outra ou outras possibilidades interpretativas que o preceito admitia. Tal interpretação busca encontrar um sentido possível para a norma, que não é o que mais evidente resulta da leitura de seu texto.

A eleição de uma linha de interpretação procede-se á exclusão expressa de outra ou outras interpretações possíveis, que conduziriam a resultado contrastante com a Constituição.

Logo, somente com a utilização da interpretação conforme a constituição, meio de interpretação e de decisão constitucional, será possível a salvação da norma, postulando-se a negativa de aplicação do art. 33 e a interpretação conforme do art 41 da Lei 11340/06 efetivando-se assim o controle difuso de constitucionalidade, incidente em qualquer causa e juízo, ante o evidente equivoco do legislador federal.

Bibliografia

Curso de Direito Constitucional, São Paulo: Saraiva, 1989.

O Princípio da Proporcionalidade no Direito Penal, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003.

Juizados Especiais Criminais, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2ª. Ed.

Prado, Luiz Regis. Curso de Direito Penal Brasileiro. 2ª edição. RT: 2.000.

Valores Constitucionais e Direito Penal, Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1989.

Juizados Especiais Criminais, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2ª. ed.


Notas:

* Flávio Ribeiro da Costa, Advogado Publicísta Especialista em Direito Penal e Processual pela UNIRP, Pós-graduado em Direito Público Universidade Federal de Uberlândia 2007. [ Voltar ]

Palavras-chave: inconstitucionalidade

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